sábado, 11 de fevereiro de 2012

Guarda dos Olhos


Por Padre Leo Trese

12,00

" Ao primeiro toque do Angelus terminou o exame de consciencia, que hoje foi um pouco mais breve. Mais breve, ou não, tive um ou dois minutos bastante desconfortáveis.

Custos oculorum - guarda dos olhos - é o tema do meu exame de consciencia, um tema que adotei por simples formalidade, certo de que o assunto quase não me dizia respeito. Mas essa minha certeza debilitou-me consideravelmente. Esta questão de exame de consciencia tem o estranho dom de fazer-me descobrir pedras no caminho e acabar por demonstrar que são enormes pedregulhos.

Não tinha pensado nisso antes, mas agora tenho que confessar que até os meus olhos, se não tomarem cuidado, podem serem apanhados pela isca dos vistosos anúncios de uma revista. Para não mencionar...,sim, para não mencionar uma infinidade de coisas. Uma infinidade de coisas que poderíamos levar para a brincadeira (e de fato levamos), mas que não parecem tão engraçadas ao meio-dia, quando se está ajoelhado diante do Sacrário.

Não há dúvida de que tenho matéria para mais alguns exames. A guarda da vista levar-me-á a outros assuntos. Porque o espírito humano (ao menos o meu) pode ser um impostor. É capaz de descobrir um círculo quadrado e conciliar sutilmente teorias e práticas contraditórias. É capaz de nos dar a sensação de que resistimos perfeitamente, quando um juiz honesto nos demonstraria que a nossa resistencia chegou tarde demais.

Colocado entre a espada e a parede, nem assim quererá assinar uma rendição honrosa; procurará desculpar-se até o fim e confessará: "Já que Deus me considera culpado, reconheço a minha falta", em vez de dizer: "Porque Deus sabe que eu sou culpado..."

Não acho que tenha muitos espíritos enganadores como o meu.

É capaz de se envergonhar muito - envergonhar-se, não arrepender-se - quando uma queda lhe mostra toda sua fraqueza, e no entanto, chegar a estúpida auto-confiança de pensar que da próxima vez se comportará como uma rocha inabalável.

Enquanto puderam inventar alibes, não quererá enfrentar sinceramente a realidade, tal como a meditação e o exame nos fazem ver. O "muito ocupado" e o "amanhã", sendo desculpas suficientes.

Uma séria meia hora de joelhos podia ajudar-me a ver como evidente aquilo que, no fundo, é uma ocasião de pecado que eu há muito tempo me nego a admitir; mesmo uns 15 minutos numa igreja silenciosa poderiam abrir-me os olhos e mostrar-me como tantas vezes tenho andado perto do mal, assobiando tranquilamente, como se não soubessem que tinha entrado em território inimigo.

Há tantas coisas que parecem mudar de aspecto, à luz da lamparina do Sacrário! O chamado "critério cientifico" ou o "valor artistico" que se envocam como se fossem um detergente mágico que purificam qualquer indecência ou justifica as mais aberrantes e ofensas ao pudor, examinados na penumbra serena de uma igreja, não me parecem capazes de contrabalançar o escandalo que produzem as feridas que causam nas consciências delicadas, o baixo nível moral que revelam em quem fala e em quem ouve.

Penso nos sacerdotes que mais admiro e percebo que são os mesmos que hoje continuam a falar numa linguagem tão pura e doce como quando ainda não tinham começado a folhear os textos de teologia moral. Jamais perderam a simplicidade e a inocência.

É agora que estremeço ao recordar tantas exposições sobre a "santa virtude" - a virtude da castidade - que eu escutava cheio de vaidade complacente, enquanto o diretor do retiro nos previnia sobre os perigos que podiam advir de um trato leviano com o sexo oposto. Sentia-me tão seguro contra esses perigos externos que não pensavam em como era vulnerável o meu interior.

É agora ainda que recordo os conselhos impacientes que dava a penitentes difíceis - oração, vigilância, fugir das ocasiões, levantar-se imediatamente pela confissão individual - e compreendo com pavos como me esquecia de aconselhar-me a mim mesmo.

Agora posso ver o que antigamente não via: que os outros serão mais fortes se eu for menos fraco...que o rebanho não se dispersará se eu estiver mais vigilante.

A graça! Esta é a palavra de ouro! Toda minha auto-condenação não pode obscurecer o fato de que a graça de Deus é capaz de vencer até a minha astúcia fraudulenta."A quem faz tudo quanto pode, Deus não nega sua graça" - esta é a tabua de salvação que se torna bem visível neste momento e dor e arrependimento.

Sei que devo agarrar-me a ela prontamente. O tempo da graça é sempre agora.

O filho pródigo não desperdiçou tempo na viagem de regresso; Maria Madalena não esperou que a refeição terminasse para lançar-se aos pés do Senhor; o bom ladrão não adiou a sua conversão até verificar se Cristo descia da cruz.

A paz e a tranquilidade estão batendo a minha porta. Estes dias miseráveis e sombrios, devidos as minhas lutas interiores e aos remorsos pessoais, podem desaparecer tão facilmente...

O último toque do Angelus perde-se ao longe na campina tranquila. Ganharei a indulgência, agora que os sinos acabaram de tocar? Seja como for, "o Anjo do Senhor anunciou a Maria..."

Fonte: Vaso de Argila

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