segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Chesterton


"Alguns céticos escreveram que o grande crime do Cristianismo tinha sido o seu ataque contra a família.

O Cristianismo arrastava as mulheres para a solidão e para a vida contemplativa de um mosteiro, longe de seus lares e de seus filhos. Mas logo outros céticos (ligeiramente mais avançados) vinham dizer que o grande crime do Cristianismo era forçar-nos ao casamento e à contituição da família, condenando as mulheres ao duro trabalho do lar e dos filhos, proibindo-lhes a solidão e a vida meditativa.

As acusações eram, na verdade, contraditórias. Dizia-se, ainda, que algumas palavras das Epístolas ou do Reino do Matrimônio revelavam desprezo pelo intelecto das mulheres. No entanto, concluí que os próprios anticristãos sentiam desprezo pelo intelecto das mulheres, porque seu grande desdém pela Igreja no continente era devido ao fato de afirmarem que “só as mulheres”a frequentavam.

Outras vezes, o Cristianismo era censurado por seus trajes indigentes e pobres, por seu burel e suas ervilhas secas. Entretanto, no momento seguinte o Cristianismo era censurado por sua pompa e ritualismo, seus relicários de pórfiro (mármore que apresenta cristais brancos em contraste com o fundo) e suas vestes de ouro. Acusavam-no por ser demasiadamente humilde e por ser demasiadamente pomposo.

O Cristianismo era acusado, ainda, de ter sempre reprimido ao extremo a sexualidade, quando Bradlaugh, o Maltusiano (economista que concluiu que a população crescia em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos só crescia em progressão artimética, propugnava um rígido controle da natalidade), descobrira que ele a reprimia muito pouco. De um só fôlego, lançavam-lhe ao rosto uma recatada respeitabilidade e uma religiosa extravagância.

Na capa do mesmo panfleto ateu fui encontrar a Fé censurada por sua falta de união (“uns pensavam uma coisa, outros pensavam outra”) e, ao mesmo tempo, por sua união ( “é a diferença de opinião que impede o mundo de se arruinar”). No decorrer da mesma conversa, um amigo meu livre pensador, censurava o Cristianismo por desprezar os judeus e depois desprezava a si mesmo por ser judeu.

Eu desejava ser absolutamente imparcial , como ainda o desejo ser agora, e não concluí que o ataque ao Cristianismo fosse de todo injusto. Concluí apenas que, se o Cristianismo estava errado, estava, sem dúvida, muito errado. Tão hostis terrores poderiam ser combinados em um só coisa, mas tal coisa devia ser bem estranha e única.

Há homens que são avarentos e, ao mesmo tempo, perdulários; porém, são raros. Há também homens lascivos e, ao mesmo tempo, ascéticos, mas estes também são raros. Mas, se este amálgama de loucas contradições realmente existisse, pacifista e sanguinário, suntuoso e maltrapilho, austero e lascivo, inimigo das mulheres e seu tolo refúgio, pessimista declarado e otimista ingênuo, se este mal existisse, então, haveria nele algo de supremo e único.

De fato, não encontrei nos meus mestres racionalistas explicação alguma para tão excepcional corrupção. O Cristianismo (teoricamente falando) era, a seus olhos, apenas um dos mitos ordinários e um dos erros dos mortais. Eles não me davam a chave para esta retorcida e desnatural maldade. Esse mal assumia as proporções do sobrenatural.

Era, sem dúvida, quase tão sobrenatural como a infabilidade do Papa. Uma instituição histórica que nunca se mostrou acertada é um milagre tão grande como uma instituição que nunca pode errar. A única explicação que imediatamente me ocorreu à mente foi que o Cristianismo não viera do Céu, mas do inferno. Na verdade, se Jesus de Nazaré não fosse Cristo, devia ser o anticristo.

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