quinta-feira, 12 de abril de 2012

Deus pode caber na minha cabeça?


Por Alfonso Aguilló

A grandeza de um homem está em saber reconhecer sua pequenez .(Blaise Pascal)

Reconhecer as nossas limitações

Se um aluno do colegial vai um dia à Universidade e assiste a uma aula de doutorado que trata de uma matéria especialmente complexa, não deve estranhar que perca com frequência o fio da explicação ( se é que em algum momento chegou a tê-lo nas mãos).Pensará que isso é natural, já que a matéria está muito acima da sua compreensão. Algo de semelhante acontece com a compreensão da natureza de Deus que o homem pode alcançar.

Se o estudante do nosso exemplo dissesse que tudo o que ouviu nessa aula é mentira pela simples razão de que ele não entendeu nada, seria preciso fazê-lo ver - educadamente, sem dúvida - que não é a sua capacidade de entender as coisas que faz com que elas sejam verdadeiras.

A verdade não tem obrigação de ser correspondida inteiramente por todas as pessoas. E isto não quer dizer que as pessoas sejam tolas, nem que se deva renunciar a razão, mas apenas que é preciso reconhecer que temos limitações. Por isso, disse Pascal e era um grande cientísta - que a "grandeza de um homem está em saber reconhecer a sua pequenez".

Para voltarmos ao nosso exemplo, o professor de pós-graduação talvez possa tornar a matéria mais acessível, com exemplos ou simplificações mais ou menos felizes que ajudem o aluno a entende-la. E tambem poderá refutar, com maior ou menor acerto pedagógico, as objeções que o rapaz levante. Mas não conseguirá faze-lo entender todas as aulas perfeitamente e até as últimas consequencias. Porque está em outro nível.

Pensar que alguém é tão inteligente que possa abarcar Deus por completo é de uma ingenuidade tão espantosa como presunçosa. É mais ou menos, como se o aluno do nosso exemplo pensasse que entendeu perfeitamente tudo o que escutou na aula (neste caso provavelmente teria entendido algo muito diferente do que realmente foi explicado).

Se alguém diz que Deus não existe porque não cabe por completo na sua cabeça, será preciso faze-lo considerar que, já não seria Deus. E isso não tem nada a ver com a possibilidade de a razão humana demonstrar a existencia de Deus.

A razão é capaz de chegar a Deus, mas demonstrar a existencia de Deus não é compreender inteiramente o ser de Deus. Para crer, é preciso reconhecer humildemente - e sei que é difícil ser humilde - as limitações da razão humana. Assim poderemos aproximar-nos de uma realidade que é muito superior a nós.

Mas Deus não poderia ter feito alguma coisa para que o conhecessemos mais facilmente?

Penso que já fez muito, uma vez que se revelou, como veremos adiante. Talvez seja o homem quem precise fazer alguma coisa mais. Além disso, quem somos nós para prescrever a Deus o modo mais adequado de se dar a conhecer?

Deus não quis obrigar o homem a reconhece-lo forçosamente. A razão humana pode demonstrar a existencia de Deus e conhecer bastante sobre a sua natureza. Mas não pode chegar por si só a alcançar muitas outras verdades relativas à natureza de Deus.

O fato de o homem não conseguir captar algumas verdades não tem porque por em causa essas verdades. Como explica Mariano Artigas, isso tbem acontece continuamente nas ciencias. Por exemplo, ninguém duvida da existencia das partículas subatomicas, apesar de chocarmos com dificuldades - que, por enquanto são insolúveis - quando tentamos explicar a sua natureza.

Mas essas dificuldades não impedem que tenhamos muitos conhecimentos bem comprovados sobre essas partículas e que possamos utilizá-las como base de algumas tecnologias muito avançadas.

A fé é compatível com a razão, mas é difícil para o homem chegar a compreende-la em profundidade com o auxílio exclusivo da razão. Por isso, a Revelação constitui uma grande ajuda no laborioso caminho da inteligencia humana.

Crer em alguma coisa...

Que não estou certo que exista?

Há homens que se declaram agnósticos porque dizem que ninguém conseguiu demonstrar-lhes de forma convincente que Deus existe. Dizem que não podem rezar a um ser de quem não sabem com certeza se existe, porque seria como lançar ao mar mensagens numa garrafa, sem saber se alguém as apanhará.

No entanto, os náufragos em ilhas desertas lançavam ao mar garrafas com mensagens dentro; pelo menos, é o que se conta. E imagino que o faziam porque confiar em alguma coisa que não é uma certeza esmagadora e incontestável não tem por que ser uma atitude absurda.

Absurdo seria ficar sem fazer nada por não saber com toda a certeza de alguém chegará algum dia a encontrar a garrafa.

Sim, mas eles optam por não arriscar nada, e por isso preferem não crer em nada, já que não há nada claramente demonstrado.

Com esse modo de pensar, seria preciso deixar de acreditar até que se é filho dos próprios pais - peço desculpas pelo exemplo um pouco contundente - como a única solução segura para evitar o risco de amar pais falsos. A maioria de nossos conhecimentos procede da fé humana, isto é, do testemunho de outras pessoas e, na maioria dos casos, não podemos comprová-los.

E isso inclui dados tão simples como quem são os nossos pais, o nosso lugar e data de nascimento, a maior parte da geografia e da história, e um lomguíssimo etcétera.

No entanto costumamos acreditar que o remédio que tomamos é o que está indicado na caixa, ou que as placas de sinalização das estradas nos vão mandar ao lugar indicado, ou que realmente existe aquele país distante que aparece nos mapas e do qual a imprensa tanto fala, mas que nunca visitamos. Porque isso é o que é sensato.

Passamos a vida inteira - todos, também aqueles que dizem não acreditar em nada - tendo fé em muitas coisas, correndo riscos, confiando no que não está claramente provado.

Fé quer dizer crédito ou confiança. Se quizéssemos demonstrar tudo, acabaríamos por ver-nos metidos num processo infinito em que a desconfiança absoluta limitaria drasticamente os nossos movimentos e atos, e a nossa vida ficaria reduzida ao pequeníssimo ambito daquilo que cada qual pode compreender pessoalmente.

Por isso, o fato de a fé em Deus exigir uma atitude de aceitação é também algo muito sensato. O que não seria sensato é o ceticismo absoluto, ou pedir um desproporcionado grau de segurança. E menos sensato ainda se só se exigisse isso em questões de religião ou de moral.

A própria amizade, sem ir mais longe, requer o exercício da fé e da confiança, já que, sem elas, nenhum amigo seria digno desse nome.

Assim o entendia um pensador da Antiguidade, que se perguntava: "Como posso afirmar que não se deve acreditar em nada sem conhecê-lo diretamente, se, no caso de não se acreditar em nada que a razão não possa demonstrar com toda a certeza, não existiriam nem a amizade, nem o amor".

Acreditar em alguma coisa que me complica a vida?

- Por vezes, a resistencia a crer em Deus é, sobretudo, uma resistencia da vontade para evitar complicações morais . Se, dúvida, e por isso muitos agnósticos se amparam na desculpa de que não se pode conhecer com certeza a existencia de Deus, para assim viverem na prática como se Ele não existisse.

E resolvem as suas dúvidas intelectuais apostando, na prática, pela não existencia de Deus, como uma segurança e assumindo uns riscos difíceis de conciliar com os raciocínios de que partem.*

(A palavra agnóstico, em grego: agnosceo significa "não sei".)

Essa atitude pode ser muito atraente para aqueles que procuram eludir algumas das obrigações morais que a existencia de Deus traz consigo, pois lhes permite evitar o incomodo de refutá-las. Dessa maneira, o seu agnosticismo acaba por ser uma simples fachada intelectual que esconde alguns posicionamentos que talvez pareçam comodos,mas são, sem dúvida, muito pouco consistentes.

Há outros - a quem talvez devessemos elogiar inicialmente pela sua sinceridade - que afirmam crer em Deus, mas preferem colocá-lo entre parenteses porque, por algum motivo mais ou menos inconfessado, não tem interesse em ver afetada a sua vida.É o indiferentismo, que, embora possa ser efetivamente sincero, não parece um exemplo de coerencia.

Outros professam uma espécie de agnosticismo estético, e faze, equilíbrios difíceis entre o ceticismo e a busca da aprovação social, ou entre o medo ao compromisso e o medo ao "que dirão". Parecem pensar que a incredulidade é uma prova de elegancia e sabedoria, e talvez seja por isso que chegam ao extremo de fingi-la.

Em qualquer caso, são atitudes nascidas de decisões pessoais,que podem ser tomadas com toda a liberdade, certamente, mas que com frequencia, não se baseiam numa argumentação intelectual muito rigorosa.

A argumentação costuma vir depois da decisão, para justificá-la.

Fonte: É Razoável Crer? - Quadrante

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Depois veremos: Agnosticismo e Cálculo de Probabilidades.

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