quarta-feira, 23 de maio de 2012

E nós nos gloriamos da Cruz





Por Gustavo Corção

"Hoje já é possível ser católico sem encontrar nas portas de engraxates os poemas  que zombam e os tratados que provam; de todo um volumoso lixo dum século racionalista sobrou apenas a poeira leve dum ateísmo crônico que funciona nos cursos oficiais.

Depois de Newman, de Maritain, de Karl Adam, o Catolicismo oferece nos mercados do pensamento alguns títulos de vitória intelectual, e agora, quando ouvimos falar de evolucionismo ou positivismo, somos nós que sorrimos e temos material para fácil escárnio.

Realmente, depois do século do vapor e da eletricidade, podemos tirar nossa esperada desforra e arvorar nossa glória intelectual com nomes prestigiosos de autores que todo o mundo respeita. É a nossa vez. Temos Maritain, Chesterton, Newman, Adam. Contam de Bergson que se converteu pouco antes de morrer. Temos o imenso Bloy, Péguy, Bernanos; temos Guardini, Dom Vonier, Dom Marmion....

O convertido encontra um caminho largo e fácil, tendo razão contra a tolice elementar das academias; em cada esquina aumenta seu triunfo porque em cada passo encontra mais um nome de autor respeitado ou grande convertido.

E lá vai ele, o novo cristão, contente, tendo razão, contente em ter razão, sem ouvir os antigos sarcasmos e até recebendo de vez em quando os cumprimentos respeitosos dos senhores bem vestidos que ficam conversando nas portas sobre mulheres ou gasogênio. Lá vai ele, o novo cristão, com sua coroa imaginária, com sua euforia  de sujeito que acertou, tendo razão num mundo em que os próprios ministros de nações poderosas já falam em civilização cristã.

O caminho parece fácil e largo; mais adiante um pouco, ali mesmo naquela volta do caminho, naquele ângulo do calendário, marcado por um solstício e por um plenilúnio, dir-se-ia que ele encontrará um monumento enguirlandado, um arco triunfal, um obelisco: mas de repente ele encontra a Cruz.

Esse momento é decisivo e essa prova é sempre dura; a glória da Cruz, vista pela fé, é uma prova que o homem novo tem de carregar todos os dias, entrando em luta com o homem velho que se tinha instalado no mundo com suas convicções, seus tiques intelectuais e sobretudo seu critério de vitória. Justamente quando lhe parecia estar próximo um novo triunfo, um acréscimo de prestígio, um formidável sucesso, ele esbarra na Cruz.

O homem novo sobressalta-se e esperneia sob o aguilhão; apalpa-se, busca apoio no seu próprio discernimento que até ali o servia como bússula fiel para indicar com nitidez os caminhos da credibilidade  e que agora perece ter enlouquecido sob a ação de estranho magnetismo. Ele mesmo pedira a fé. Pusera de joelhos seu corpo, sua alma, suas convicções, sua inteligência, pusera tudo de joelhos; submetera a razão à prova última do reconhecimento e do amor; escolhera, decidira casar-se em vez de ficar a vida inteira excogitando; optara; pedira a Deus com amoroso temor a nova aliança de noivado....E agora, ao levantar-se, sente nos ombros o peso duma Cruz"

Veja: Padre Antonio

Fonte: A descoberta do Outro.

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