segunda-feira, 20 de abril de 2009

Mortificação - Parte I


A mortificação contribui, com a penitência, para purificar das faltas passadas; mas o seu fim principal é premunir-nos contra as do presente e do futuro, diminuindo o amor do prazer, fonte dos nossos pecados.

Sua natureza, a Sua Necessidade e a Sua Prática.

Natureza -> Seus diversos Nomes e sua Definição.

Necessidade -> Para a Salvação e para a Perfeição.

Prática -> Princípios gerais - Mortificação dos sentidos exteriores - Mortificação dos sentidos interiores - Mortificação das paixões e Mortificação das faculdades

I. Natureza da Mortificação

A - Expressões bíblicas, para designar a mortificação. Encontramos sete expressões principais nos Livros Santos, para designar a mortificação sob os seus diversos aspectos.

1 - A palavra renúncia: «qui non renuntiat omnibus quae possidet non potest meus esse discipulus» apresenta-nos a mortificação como um ato de desprendimento dos bens exteriores, para seguirmos a Cristo. Assim fizeram os Apóstolos: «relictis omnibus, secuti sunt eum»

2 - É também uma abnegação ou renúncia a si mesmo: «Si quis vuli post me venire, abneget semetipsum» E na verdade, o mais terrível dos nossos inimigos é o amor próprio desordenado; eis o motivo por que é forçoso desapegar-nos de nós mesmos.

3 - Mas a mortificação tem um lado positivo: é um ato que fere e atrofia as más tendências da natureza: «Mortifica te ergo membra vestra .. Si autem Spiritu facta carnis mortíficaveritis, vivetis »

4 - Mais ainda é uma crucificação da carne e das suas concupiscências, pela qual cravamos, por assim dizer, as nossas faculdades à lei evangélica aplicando-as à oração, ao trabalho: «Qui sunt Christ, carnem suam crucifixerunt cum vitiis et concupiscentiis»

5 - Esta crucifixão, quando persevera, produz uma espécie de morte e de en terramento, pelo qual parecemos morrer completamente a nós mesmos e sepultar-nos com Jesus Cristo, para vivermos com Ele uma vida nova «Mortui enim estis vos et vita vestra est abscondita cum Cristo in Deo … Consepulti enim sumus cum illo per baptismum in mortem» .

6 - Para exprimir esta morte espiritual. São Paulo serve-se doutra expressão: como, depois do batismo, há em nós dois homens, o homem velho que fica, ou a tríplice concupiscência, e o homem novo ou o homem regenerado, declara o Apóstolo que é nosso dever «despojar-nos do homem velho, para nos revestirmos do novo: expoliantes vos veterem hominem ... et induentes novum» .

7 - E, como isto se não faz sem combater, declara ainda que a vida é combate «bonum certamen celta vi», que os cristãos são lutadores ou atletas que castigam o seu corpo e reduzem a servidão.

De todas estras expressões e outras análogas, resulta que a mortificação compreende um duplo elemento: um negativo, o desprendimento, a renúncia, o despojamento; e outro positivo, a luta contra as más tendências, o esforço para as mortificar ou atrofiar, a crucificação, a morte da carne, do homem velho e das concupiscências, a fim de vivermos da vida de Cristo.

B- Expressões modernas.

Hoje vai-se preferindo o uso de expressões mitigadas, que indicam o fim que se pretende atingir, antes que o esforço que para isso se tem de empregar. Diz-se que é mister reformar-se a si mesmo, governar-se a si mesmo, fazer a educação da vontade, orientar a sua alma para Deus. Estas expressões são exatas, contanto que se saiba mostrar que ninguém pode reformar-se e governar-se a si mesmo, sem combater e mortificar as más tendências que em nós existem; que não se faz a educação da vontade, senão mortificando, disciplinando as faculdades inferiores, e que não há possibilidade de alguém se orientar para Deus se não desapegando-se das criaturas e despojando-se dos próprios vícios.Por outros termos, é necessário saber, como faz a Sagrada Escritura, reunir os dois aspectos da mortificação, mostrar o fim, para consolar, mas não dissimular o esforço necessário para o atingir.

C - Definição.

Pode-se, pois, definir a mortificação: a luta contra as más inclinações, para as submeter à vontade, e esta a Deus. É menos virtude que um complexo de virtudes, o primeiro grau de todas as virtudes, que consiste em vencer os obstáculos, no intuito de restabelecer o equilíbrio das faculdades, a sua ordem hierárquica. Assim se vê mehor que a mortificação não é um fim, senão um meio; o homem não se mortifica senão para viver uma vida superior, não se despoja dos bens exteriores senão para melhor conseguir os bens espirituais, não se renuncia a si mesmo senão para possuir a Deus, não luta senão para gozar .,. paz, não morre a si mesmo senão para viver da vida de Cristo, da vida de Deus. A união com Deus, é, pois, o fim da motificação. Assim, melhor se compreende a sua necessidade.

II -Necessidade da Mortificação

Esta necessidade pode-se estudar sob duplo aspecto: a Salvação e a Perfeição.

A -Necessidade da mortificação para a Salvação

Há mortificações necessárias para a salvação, neste sentido que, se não se fazem, há perigo de cair no pecado mortal.

1 - Nosso Senhor Jesus Cristo fala disto clarissimamente, a propósito das faltas contra a castidade: «Todo aquele que olhar para uma mulher com concupiscência, ad concupiscendam eam, já cometeu adulério com ela em seu coração». Há, pois, olhares gravemente pecaminosos, os que são inspirados por maus desejos; e a mortificação de tais olhares impõe-se sob pena de pecado mortal. É afinal, o que Nosso Senhor acrescenta com estas enérgicas palavras: «Se o teu olho direito te escandaliza, arranca-o, e lança-o para longe de ti; porque melhor te é que pereça um só dos teus membros do que ser todo o teu corpo lançado na geena». Não se trata aqui de vazar os próprios olhos, senão de arrancar a vista desses objetos que são cauda de escândalo.

_ São Paulo dá-nos a razão destas graves prescrições: «Se viverdes segundo a carne, morrereis; mas se, pelo Espírito, fizerdes morrer as obras da carne, vivereis: si enim secundum carnem vixeritis, moriemini, si autem Spiritu facta carnis mortificaveritis, vive tis» Como sabemos a tríplice concupiscência que permanece em nós, excitada pelo mundo e pelo demônio, leva-nos muitas vezes ao mal e põe-nos a salvação em perigo, se não temos cuidado de a mortificar. Donde resulta a necessidade absoluta de combater incessantemente as tendências perversas que em nós existem, de evitar as ocasiões próximas de pecado, isto é, esses objetos ou pessoas que, dada a nossa experiência passada, constituem para nós um perigo sério e provável de pecado, e de renunciar por isso mesmo a muitos prazeres a que a natureza nos arrasta. Há, pois, mortificações necessárias, sem as quais viríamos a cair no pecado mortal.

2 - Outras há que a Igreja prescreve, para determinar concretamente a obrigação geral, que temos de nos mortificar, tantas vezes inculcada no Evangelho: tal é a abstinência das sextas-feiras, o jejum da Quaresma, das Têmporas e Vigílias.. Estas leis obrigam sob pena de pecado grave aos que não estão legitimamente escusados ou dispensados. E neste ponto queremos fazer uma observação que não deixa de ter importância: há pessoas que, por boas razões, estão dispensadas destas leis; mas nem por isso se julguem dispensadas da lei geral da mortificação, que, por conseguinte, devem praticar por outra forma qualquer. Sem o que, não tardariam a sentir as revoltas da carne.

3 -Além destas mortificações prescritas pela lei divina e eclesiástica há outras que, com o parecer do próprio diretor, cada qual deve tomar em certas circunstâncias particulares, quando as tentações se tornem mais importunas. Escolher-se-ão entre as que depois indicaremos.

B - Necessidade da mortificação para a Perfeição

Esta necessidade promana da natureza da perfeição, que, consiste no amor de Deus até o sacrifício e imolação de nós mesmos, de tal sorte que, segundo a Imitação, a medida que nosso progresso espiritual depende da violência que a nós mesmos nos fazemos: tantum proficies quantum tibi ipsi vim intuleris . Bastará, recordar sumariamente alguns motivos que poderão influir sobre a nossa vontade, para a ajudar a cumprir este dever. Esses motivos tiram-se da parte de Deus, de Jesus Cristo, e da nossa santificação pessoal .

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Segundo, TANQUEREY, Adolph: A Vida Espiritual Explicada e Comentada. Anápolis: Aliança Missionária Eucarística Mariana, 2007. pgs. 403-434).

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