segunda-feira, 4 de maio de 2009

Credo - Terceiro Artigo



Foi concebido do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria

Por São Tomás de Aquino

Não é somente necessário ao cristão acreditar que Jesus Cristo é o Filho de Deus, como acima mostramos, mas também convém crer na Sua Encarnação. Por isso, o Bem-aventurado João, após ter falado muitas coisas elevadas e de difícil compreensão, logo a seguir nos insinua a Sua Encarnação, quando diz: E o Verbo se fez carne (Jo 1,14).

Para que possamos aprender algo dessa verdade, darei dois exemplos:

Sabe-se que nada é tão semelhante ao Filho de Deus como a palavra concebida em nosso interior, mas não pronunciada exteriormente. Ninguém conhece a palavra enquanto está no interior do homem, a não ser ele, que a concebeu. Mas logo que é proferida exteriormente, torna-se conhecida. Assim o Verbo de Deus não era conhecido senão pelo Pai, enquanto estava no seio do Pai. Mas logo que se revestiu da carne, como palavra concebida no interior, pela voz, tornou-se manifesto e conhecido. Lê-se na Escritura: Depois disso foi visto na terra, e conviveu com os homens (Bar 3,38).

Vejamos o segundo exemplo: A palavra, pronunciada exteriormente, é ouvida, mas não é vista, nem se pode nela tocar. Escrita, porém, em uma folha, pode ser vista e tocada. Assim também o Verbo de Deus tornou-se visível e palpável, quando foi, de certo modo, escrito em nossa carne. Ora, quando numa mensagem estão escritas as palavras do rei, ela também é chamada de palavra do rei. Do mesmo modo, o homem a quem está unido o Verbo de Deus numa só pessoa, deve ser chamado: Filho de Deus. Lê-se em Isaías: Toma o grande livro e escreve nele com a pena de um homem (Is 8,1).

Declararam também os Apóstolos: Que foi concebido do Espírito Santo, nasceu da Virgem Maria.

Com relação a este artigo do Credo, muitos caíram em erros. Por isso os Santos Padres, em outro Símbolo, o de Nicéia acrescentaram muitos esclarecimentos que nos permitem agora ver como esses erros foram destruídos.

Origenes afirmou que Cristo nasceu e que veio a este mundo para salvar os homens e também o demônio. Disse ainda que todos os demônios seriam salvos no fim do mundo. Afirmar tal coisa, porém, é ir contra a Sagrada Escritura, pois se lê no Evangelho de S. Mateus: Afastai-vos de mim, malditos, e ide para o fogo eterno, que foi preparado para o diabo e para os seus anjos (Mt 25,41). Por essa razão, foi acrescentado no Símbolo: Que desceu dos céus para nós, homens (não se diz: para os demônios) e para a nossa salvação. Essas palavras evidenciam, ainda mais, o amor de Deus para conosco.

Fotino, não obstante ter aceito que Cristo nasceu da Bem-aventurada Maria Virgem, afirmou que Ele era um simples homem, que, por ter vivido bem e ter feito a vontade de Deus, mereceu ser considerado Filho de Deus, como o são os ou santos. Contra essa afirmação, lê-se na Escritura: Desci do céu, não para fazer a Minha, mas a vontade de quem me enviou (Jo 6,38). Ora, é evidente que não teria descido do céu, se aí não estivesse; e, se fosse um simples homem, não poderia estado no céu. Para afastar esse erro, foi acrescentado: desceu dos céus.

Manéss ensinava que Cristo foi sempre Filho de Deus e que desceu do céu, mas que não possuía verdadeira carne, pois que esta era apenas aparente. Isso é falso. Ora, não convinha ao Mestre da verdade mostrar-se com alguma falsidade. Por isso, como apareceu em verdadeira carne, devia tambéin possuí-Ia. Lê-se no Evangelho de S. Lucas: Palpai e vede, porque o Espírito não tem carne nem ossos, como me vedes possuir (Le 24,39). Para afastar tal erro, os Padres acrescentaram: E se encarnou.

Ebion, que era judeu, aceitava ele que Cristo tivesse nascido da Bem-aventurada Maria, mas de uma união carnal, e de sêmen humano. isso, porém, é falso, porque o Anjo disse: O que nascerá dela, é obra do Espírito Santo (Mt 1,20). Para afastar esse erro, os Padres acrescentaram: Do Espirito Santo.

Valentino aceitava que Cristo tivesse sido concebido pelo Espírito Santo, mas também ensinava que Cristo trouxera um corpo celeste e o depositara na Bem-aventurada Virgem, e que este corpo era o de Cristo. Por esse motivo, dizia, a Bem-aventurada Virgem nada fizera senão ter-se dado como receptáculo daquele corpo, e que este passava por ela, como por um aqueduto. Mas tal afirmação é falsa, porquanto o Anjo disse: O santo que de ti nascer, será chamado Filho de Deus (Lc 1,35). Do mesmo modo, o Apóstolo: Quando chegou a plenitude do tempo, enviou Deus o seu Filho feito de mulher(Gál 4,4). Eis porque os Padres acrescentaram no Símbolo: Nasceu da Virgem Maria.

Ario e Apolinário afirmaram que Cristo era o Verbo de Deus e que nasceu da Virgem Maria, mas que não possuía alma, estando, em lugar desta, a divindade. Mas isso é contra Escritura, onde se encontram estas palavras de Cristo: ora, a minha alma está perturbada (Mt 26,38). Para refutar o erro de ambos, os Santos Padres acrescentaram Símbolo: E fez-se homem. Ora, o homem é constituído de alma e corpo. Por conseguinte, Ele possuiu tudo o que o em pode possuir, exceto o pecado.

Pela expressão - fez-se homem - são destruídos todos os erros acima enumerados, e todos os que possam surgir. Foi estruído, por essa expressão, principalmente o erro de Eutíquio que ensinou ter havido em Cristo uma mistura, isto é, que havia uma só natureza em Cristo, oriunda da divina e da humana, de modo que Cristo não era nem simplesmente Deus, nem simplesmente homem. Tal afirmação é falsa, porque, se não fosse falsa, Cristo não seria homem como fora definido: fez-se homem.

É destruído também o erro de Nestório que afirmou que o Filho de Deus uniu-se ao homem só por inabitação. É falsa também essa doutrina, porque então não estaria escrito apenas homem, mas no homem. O Apóstolo declara que Cristo foi homem: Foi reconhecido, conforme se apresentou, como homem (Fil 2,7). Lê-se também em S. João: Por que me quereis matar, eu, um homem, que vos disse a verdade que ouvi de Deus? [J o 8,40).

Dessa exposição sobre o 3.° artigo do Credo, podemos tirar algumas conclusões práticas para nossa instrução:

Em primeiro lugar, para confirmação da nossa fé:

Se alguém falasse de uma terra longínqua, na qual nunca estivera, não seria tão bem aceita a sua palavra como o seria, se a conhecesse. Antes da vinda de Cristo, os Patriarcas, os Profetas e João Batista falaram algumas verdades a respeito de Deus. Os homens, porém, não acreditaram nelas como acreditaram em Cristo, que esteve com Deus, e, mais do que isso, constituía um só ser com Ele. Eis porque a nossa fé foi muito mais confirmada pelas verdades transmitidas por Cristo. Lê-se em São João: Ninguém jamais viu a Deus. O Filho Unigênito, que está no seio do Pai, nos revelou (Jo 1,18). Muitos mistérios da fé, que antes estavam velados, nos foram revelados após o advento de Cristo.

Em segundo lugar, para elevação da nossa esperança.

Sabemos que o Filho de Deus, não sem elevado motivo, veio a nós, assumindo a nossa carne, mas para grande utilidade nossa. Fez, para consegui-la, um certo comércio: assumiu um corpo animado, e dignou-se nascer da Virgem, para nos entregar a Sua divindade; fez-se homem, para fazer o homem Deus. Lê-se em S. Paulo: Por quem temos acesso pela fé nessa graça, na qual permanecemos, e nos gloriamos na esperança da glória dos filhos de Deus (Rom 5,2).

Em terceiro lugar, para que a nossa caridade seja mais fervorosa.

Nenhum indício é mais evidente da caridade divina que o de Deus, criador de todas as coisas, fazer-se criatura; o do Senhor nosso, fazer-se nosso irmão; o do Filho de Deus, fazer-se filho de homem. Lê-se em S. João. Tanto Deus amou o mundo, que lhe deu o Seu Filho (Jo 3,16). Pela consideração dessa verdade, deve ser reacendido, e de novo em nós afervorado, o nosso amor para comDeus.

Em quarto lugar, para conservação da pureza de nossa alma.

A nossa natureza foi a tal ponto enobrecida e exaltada pela união com Deus, que foi assumida para consociar-se com uma Pessoa Divina. Por esse motivo o Anjo, após a Encarnação, não permitiu que o Bem-aventurado João o adorasse, quando antes permitira que até os maiores Patriarcas o fizessem. O homem, pois, reconsiderando e atendendo à própria exaltação, deve perceber como se degrada e avilta a si e à própria natureza, pelo pecado. Por isso, escreve S. Pedro: Por quem nos concedeu as máximas e preciosas promessas, para que nos tornássemos consortes da natureza divina, fugindo da corrupção da concupiscência que existe no mundo (2 Ped 1,5).

Em quinto, lugar, a meditação dos mistérios da Encarnação aumenta em nós o desejo de nos aproximarmos de Cristo.

Se alguém, irmão de um rei, dele longe estivesse, naturalmentc desejaria aproximar-se dele, estar com ele, permanecer junto dele. Ora, sendo Cristo nosso irmão, devemos desejar estar com Ele e nos unirmos a Ele. Com relação a esse desejo, lê-se em S. Mateus: Onde quer que esteja o cadáver, aí se apresentarão os abutres (Mt 24,28). S. Paulo desejava dissolver-se para estar com Cristo: esse desejo cresce também em nós pela consideração do mistério da Encarnação

Fonte: Exposição sobre o Credo por São Tomás de Aquino

Nenhum comentário:

Postar um comentário