Por Padre Leo Trese
10,45
Terminada a Hora Média, puxo de um cigarro com um movimento quase instintivo. Não admira: é um movimento que repito mais ou menos trinta vezes por dia.
De cada vez que o faço, a consciência repreende-me com um aviso, já completamente familiar. E aqui estamos outra vez - penso amargamente - com outro cigarro na boca e um fósforo na mão; aqui estamos outra vez, a minha consciência e eu, às voltas com o mesmo assunto.
Consciência: Por que não deixas de fumar?
Eu: Acho que deveria.
Consciência: Pois claro! É a única coisa da tua vida que não te deixa livre. Como podes falar de mortificação se fumas maço e meio de cigarros por dia?
Eu: Mas eu gosto de fumar e sabes perfeitamente que o Dr. Fitzgerald disse que não me fazia mal. Além disso, não me esqueço de dar graças a Deus, por esta pequena satisfação. Não faço bem?
Consciência: É claro que não. Fazer as coisas sómente por prazer parece-me um pecado. Uma ação que não tenha um fim sobrenatural não tem valor.
Eu: Estás então querendo dizer que faço mal porque gosto de ver o nascer do sol da janela do meu quarto? Ou porque gosto de respirar o perfume dos lilases na primavera ou das folhas secas no outono? Ou porque...
Consciência: Alto lá! Estávamos falando de cigarros. És capaz de dizer-me o nome de um santo que tivesse o hábito de fumar?
Eu: Muito bem, se preferes argumentos ad hominem, permite-me uma pergunta: és capaz de dizer o nome de um santo cuja canonização tenha sido recusada por fumar, mascar tabaco ou aspirar rapé?
Acho que nossa questão não é de santidade, mas de pecado; se for de santidade, talvez estejamos de acordo. Mas explica-me em que consiste o pecado de fumar, e eu deixarei de comete-lo agora mesmo.
Consciência: Bem, talvez não seja pecado, mas seria melhor deixares de fumar imediatamente.
Eu: Não, imediatamente não. Sabes o que aconteceria se deixasse de fumar imediatamente? Ficaria orgulhoso como o demônio da minha força de vontade; desprezaria os meus amigos que não fossem capazes de fazer como eu; estaria tão ocupado em pavonear o meu auto-domínio que esqueceria as mortificações mais importantes.
Consciência: Mais importantes? Quais por exemplo?
Eu: Não me digas que não sabes que a mortificação interior é mais importante que a exterior? Olha por exemplo o que acontece nas sextas feiras à noite: batem as nove, hora que terminam oficialmente as confissões, se eu fosse zeloso como devia, não iria correndo fechar a porta da Igreja para evitar a entrada de um retardatário, mas daria uma olhada pela rua para o caso de estar chegando algum filho pródigo.
Ou senão, olha para este outro exemplo: é um dia qualquer e eu me encontro no meu escritório, com o plano de trabalho já estabelecido, quando chega alguém querendo sentar-se e falar-me de alguma bobagem. Se eu me mortificasse interiormente descobriria nessa pessoa a vontade de Deus e não teria tanta pressa em ve-la pelas costas.
Repara finalmente, no que aconteceu no último domingo: preparava-me tranquilamente para descansar, quando me vieram dizer que a velha senhora Ebers precisava de que a levassem de carro ao hospital, a uns oitenta quilometros, para visitar o marido. Se fosse interiormente mortificado, não teria demorado quinze minutos a ir ao telefone e oferecer-me para leva-la.
Como ves, são alguns exemplos daquilo que penso serem as mortificações mais importantes. Podia deixar de fumar e continuar sendo um terrível egoísta, negligente e insuportável. Se me abstivesse da nicotina, não conseguiria nem a metade das vantagens que meia hora de oração me oferece todos os dias. Se amasse mais a Deus...
Consciência: Sim, já sei aonde queres chegar. Se amasses mais a Deus, seria mais fácil que te mortificasses. Uma renúncia heróica é mais o resultado do que a causa da virtude. Se progredisses no amor a Deus, o teu egoísmo se desfaria como uma cebola, casca por casca, até não restar nada. Pensas que chegará um dia em que te há de parecer natural e até inevitável deixar de fumar do que em agarrar-te a esse costume.
Enfim! O melhor seria aceitarmos um empate nesta disputa e eu variar a minha linha de ataque. Quanto tempo achas que precisarias para deixar de fumar segundo o teu método?
Eu: Só Deus sabe.
Há momentos em que penso que o próprio Deus desanima tentando ensinar-me a cortar o mal pela raiz. Talvez o meu aço não esteja suficientemente temperado.
Mas, consciência, não me abandones; se o conseguir, há de ser com a tua ajuda. A graça faz milagres e é possível que chegue um dia em que eu encontre verdadeira alegria em jogar cinza na comida e dormir sobre uma tábua.
Entretanto, continuarei a saborear uma boa refeição, com toda a gratidão que devo a Deus e com o maior respeito pela virtude da temperança. Em nome da fraternidade e com o devido respeito pela virtude da sobriedade, continuarei a tomar um aperitivo com os meus irmãos sacerdotes antes do jantar.
Parece-me ser uma sã doutrina pensar que tudo o que Deus faz é bom. Com toda a certeza, a alegria de um prazer inocente é obra das suas mãos e não se pode considerar um erro.
Por isso, até que...
Consciência: Cuidado! Esse fósforo vai-te queimar os dedos! Vamos, acende o cigarro e deixa de filosofar. Espero que não te convertas num racionalista. De qualquer modo, agora tenho mais que fazer. Preciso afiar a ponta da próxima seta.
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Terminada a Hora Média, puxo de um cigarro com um movimento quase instintivo. Não admira: é um movimento que repito mais ou menos trinta vezes por dia.
De cada vez que o faço, a consciência repreende-me com um aviso, já completamente familiar. E aqui estamos outra vez - penso amargamente - com outro cigarro na boca e um fósforo na mão; aqui estamos outra vez, a minha consciência e eu, às voltas com o mesmo assunto.
Consciência: Por que não deixas de fumar?
Eu: Acho que deveria.
Consciência: Pois claro! É a única coisa da tua vida que não te deixa livre. Como podes falar de mortificação se fumas maço e meio de cigarros por dia?
Eu: Mas eu gosto de fumar e sabes perfeitamente que o Dr. Fitzgerald disse que não me fazia mal. Além disso, não me esqueço de dar graças a Deus, por esta pequena satisfação. Não faço bem?
Consciência: É claro que não. Fazer as coisas sómente por prazer parece-me um pecado. Uma ação que não tenha um fim sobrenatural não tem valor.
Eu: Estás então querendo dizer que faço mal porque gosto de ver o nascer do sol da janela do meu quarto? Ou porque gosto de respirar o perfume dos lilases na primavera ou das folhas secas no outono? Ou porque...
Consciência: Alto lá! Estávamos falando de cigarros. És capaz de dizer-me o nome de um santo que tivesse o hábito de fumar?
Eu: Muito bem, se preferes argumentos ad hominem, permite-me uma pergunta: és capaz de dizer o nome de um santo cuja canonização tenha sido recusada por fumar, mascar tabaco ou aspirar rapé?
Acho que nossa questão não é de santidade, mas de pecado; se for de santidade, talvez estejamos de acordo. Mas explica-me em que consiste o pecado de fumar, e eu deixarei de comete-lo agora mesmo.
Consciência: Bem, talvez não seja pecado, mas seria melhor deixares de fumar imediatamente.
Eu: Não, imediatamente não. Sabes o que aconteceria se deixasse de fumar imediatamente? Ficaria orgulhoso como o demônio da minha força de vontade; desprezaria os meus amigos que não fossem capazes de fazer como eu; estaria tão ocupado em pavonear o meu auto-domínio que esqueceria as mortificações mais importantes.
Consciência: Mais importantes? Quais por exemplo?
Eu: Não me digas que não sabes que a mortificação interior é mais importante que a exterior? Olha por exemplo o que acontece nas sextas feiras à noite: batem as nove, hora que terminam oficialmente as confissões, se eu fosse zeloso como devia, não iria correndo fechar a porta da Igreja para evitar a entrada de um retardatário, mas daria uma olhada pela rua para o caso de estar chegando algum filho pródigo.
Ou senão, olha para este outro exemplo: é um dia qualquer e eu me encontro no meu escritório, com o plano de trabalho já estabelecido, quando chega alguém querendo sentar-se e falar-me de alguma bobagem. Se eu me mortificasse interiormente descobriria nessa pessoa a vontade de Deus e não teria tanta pressa em ve-la pelas costas.
Repara finalmente, no que aconteceu no último domingo: preparava-me tranquilamente para descansar, quando me vieram dizer que a velha senhora Ebers precisava de que a levassem de carro ao hospital, a uns oitenta quilometros, para visitar o marido. Se fosse interiormente mortificado, não teria demorado quinze minutos a ir ao telefone e oferecer-me para leva-la.
Como ves, são alguns exemplos daquilo que penso serem as mortificações mais importantes. Podia deixar de fumar e continuar sendo um terrível egoísta, negligente e insuportável. Se me abstivesse da nicotina, não conseguiria nem a metade das vantagens que meia hora de oração me oferece todos os dias. Se amasse mais a Deus...
Consciência: Sim, já sei aonde queres chegar. Se amasses mais a Deus, seria mais fácil que te mortificasses. Uma renúncia heróica é mais o resultado do que a causa da virtude. Se progredisses no amor a Deus, o teu egoísmo se desfaria como uma cebola, casca por casca, até não restar nada. Pensas que chegará um dia em que te há de parecer natural e até inevitável deixar de fumar do que em agarrar-te a esse costume.
Enfim! O melhor seria aceitarmos um empate nesta disputa e eu variar a minha linha de ataque. Quanto tempo achas que precisarias para deixar de fumar segundo o teu método?
Eu: Só Deus sabe.
Há momentos em que penso que o próprio Deus desanima tentando ensinar-me a cortar o mal pela raiz. Talvez o meu aço não esteja suficientemente temperado.
Mas, consciência, não me abandones; se o conseguir, há de ser com a tua ajuda. A graça faz milagres e é possível que chegue um dia em que eu encontre verdadeira alegria em jogar cinza na comida e dormir sobre uma tábua.
Entretanto, continuarei a saborear uma boa refeição, com toda a gratidão que devo a Deus e com o maior respeito pela virtude da temperança. Em nome da fraternidade e com o devido respeito pela virtude da sobriedade, continuarei a tomar um aperitivo com os meus irmãos sacerdotes antes do jantar.
Parece-me ser uma sã doutrina pensar que tudo o que Deus faz é bom. Com toda a certeza, a alegria de um prazer inocente é obra das suas mãos e não se pode considerar um erro.
Por isso, até que...
Consciência: Cuidado! Esse fósforo vai-te queimar os dedos! Vamos, acende o cigarro e deixa de filosofar. Espero que não te convertas num racionalista. De qualquer modo, agora tenho mais que fazer. Preciso afiar a ponta da próxima seta.
Olá. Divulguei essa sua postagem no Guia de Blogs Católicos. O site é destinado a divulgar a atividade dos blogueiros católicos de língua portuguesa. Espero que isso ajude a aumentar o número de pessoas que conhecem o seu blog.
ResponderExcluirAbraços!