terça-feira, 16 de abril de 2013

A Graça Habitual ou Santificante






Primeira parte AQUI

Segunda parte AQUI

Deus Nosso Senhor, querendo, na sua infinita bondade, elevar-nos até Si, na medida em que o permite a nossa fraca natureza, dá - nos um princípio vital sobrenatural, deiforme: é a graça habitual, graça que se chama criada, por oposição à graça incriada, que consiste na habitação do Espírito Santo em nós.

Esta graça torna-nos semelhantes a Deus e une-nos a Ele duma maneira estreitíssima.

É uma qualidade sobrenatural, inerente à nossa alma, que nos faz particípar, dum modo real, formal, mas acidental, da natureza e vida divinas.

1 - É, pois, uma realidade da ordem sobrenatural, não porém substância, pois que substância nenhuma criada pode ser sobrenatural; é uma maneira de ser, um estado da alma, uma qualidade inerente à substância da nossa alma, que a transforma e eleva acima de todos os seres naturais, ainda os mais perfeitos; qualidade permanente, de sua natureza, que fica em nós enquanto a não expelimos da alma cometendo voluntariamente algum pecado mortal.

«É, diz o Cardeal Mercier, apoiando-se em Bossuet, essa qualidade espiritual que Jesus difunde em nossas almas; que penetra o mais íntimo da nossa substância; que se imprime no mais secreto de nos almas e se derrama (pelas virtudes) em todas as potências e faculdades da alma; que, tomando posse dela interiormente, a torna pura e agradável aos olhos deste divino Salvador e a faz seu santuário, seu templo, seu tabernáculo, enfim seu lugar de delícias»

Esta qualidade torna-nos, segundo a expressão de São Pedro, participantes da natureza divina; faz-nos entrar, diz São Paulo, em comunicação com o Espírito Santo; em sociedade com o Pai e o Filho, ajunta São João. 


É claro que não nos faz iguais a Deus, mas unicamente seres deiformes, semelhantes a Deus; dá-nos, não a vida divina em si mesma, que é essencialmente incomunicável, senão uma vida semelhante à de Deus.

Ora a graça habitual é já uma preparação para a visão beatífica e um como antegosto desse favor, é o botão que já contém flor, se bem que esta não haja de desabrochar senão mais tarde; é, pois, do mesmo gênero que a própria visão beatífica e participa da sua natureza.

Esta participação da vida divina é, não simplesmente virtual senão formal. Uma participação virtual não nos faz possuir uma qualidade senão de maneira diversa daquela que se encontra na causa principal, assim a razão é uma participação virtual da inteligência divina, porque nos faz conhecer a verdade, mas de modo bem diferente do conhecimento que dela tem Deus. Não assim a visão beatífica, e, guardada toda a proporção, a fé: estas fazem-nos conhecer a Deus como Ele se conhece a si mesmo, não sem dúvida no mesmo grau, mas da mesma maneira.

Esta participação não é substancial, senão acidental. Assim se distingue da geração do Verbo, que recebe toda a substância do Pai, bem como da união hipostática, que é uma união substancial da natureza humana e da natureza divina na única Pessoa do Verbo: nós, efetivamente, conservamos a nossa personalidade, e a nossa únião com Deus não é substancial.


Para nos fazerem compreender esta divina semelhança, empregam os santos Padres diversas comparações:

1 - A nossa alma, dizem, é uma imagem viva da Santíssima Trindade uma espécie de retrato em miniatura, pois que o próprio Espírito se vem imprimir em nós, como um sinete sobre cera branda, e a sua divina semelhança. Daqui concluem que a alma em estado de graça é duma beleza arrebatadora, pois que o artista, que nela pinta esta imagem, é infinitamente perfeito, visto ser o próprio Deus.

Para mostrarem que esta semelhança não fica à superfície, se não que penetra até o mais íntimo da nossa alma, recorrem à comparação do fogo. Assim como, dizem eles, uma barra de ferro, metida em água ardente, adquire bem depressa o brilho, o calor e maleabilidade do fogo, assim a nossa alma, mergulhada na fornalha do amor divino, ali se desembaraça das escórias, tornando-se brilhante, ardente e dócil às divinas inspirações

2) Esta mesma verdade se deduz da comparação feita por alguns autores entre a união hipostática e a união da nossa alma com Deus. Não há dúvida que a diferença entre ambas é essencial: a união hipostática é substancial e pessoal, pois que a natureza divina e a natureza humana, se bem que perfeitamente distintas, não formam em Jesus Cristo mais que uma única e mesma Pessoa, enquanto a união da alma com Deus pela graça nos deixa a nossa personalidade própria, essencialmente distinta da personalidade divina, e não nos une a Deus senão dum modo acidental.


Faze-se, efetivamente, essa união, por intermédio da graça santificante, «acidente» acrescentado à substância da alma; ora, na linguagem escolástica, a união num acidente e de uma substância chama-se união «acidental» .

Nem por isso é menos verdade que a união da alma com Deus se pode dizer uma união de substância a substância , que o homem e Deus estão em contato tão íntimo como o ferro e o fogo que o envolve e penetra, como o cristal e a luz.

Para tudo resumir numa palavra, a união hipostática faz um Homem-Deus, a união da graça faz homens divinizados; e, assim como as ações de Cristo são divino-humanas ou teândricas, assim as do justo são deiformes, feitas em comum por Deus e por nós, e, por este título, meritórias da vida eterna, que não é outra coisa senão uma união imediata com a divindade.

Assim como na ordem da natureza necessitamos do concurso de Deus a passarmos da potência ao ato, assim na ordem sobrenatural não podemos pôr em ação as nossas faculdades sem o auxílio da graça atual.

Depois veremos sobre a graça atual.

 

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