Por Padre Leo Trese
Imaginemos dois homens, cada um dos quais pretende fazer um relógio. Um deles extrai da rocha uma certa quantidade de minério de ferro, purifica-o laboriosamente no crisol e transforma-o em aço; forja, molda e desbasta as peças. até obter toda uma série de minúsculas molas, engrenagens e eixos; e por fim monta essas peças todas, até obter um relógio que marca corretamente as horas. Com toda a certeza, diríamos que esse homem é um mecânico excepcionalmente capacitado, um relojoeiro incomparável.
O outro, porém, limita-se a colocar o minério de ferro sobre a palma da mão e a dizer: " Quero que isto se converta num relógio". E imediatamente a ganga começa a separar-se do ferro, este se tempera a si próprio até converter-se em aço, o aço divide-se em molas, engrenagens e eixos, e essas partes todas juntam-se umas às outras até formarem um relógio -e tudo isso, por um simples ato de vontade do "relojoeiro". A nossa admiração, diante de tal processo, certamente seria muito maior do que a que sentimos pelo primeiro.
Da mesma forma, se Deus tivesse criado o Universo parte por parte, formando separadamente cada estrela e cada planeta, cada espécie de planta e de animal, sentir-nos-íamos muito razoavelmente tentados a exclamar: " Glória a Deus nas alturas!" Mas se, ao invés de formar cada componente do universo por um ato criador distinto, tivesse começado por criar uma massa de matéria informe e, mediante um ato da sua divina vontade, lhe tivesse ordenado que se convertesse pouco a pouco no tipo de Universo - com os reinos mineral, vegetal, animal e humano - projetado por Ele na sua Mente divina..., com certeza não é preciso ser teólogo para decidir qual dos tipos de Criação refletiria de maneira mais maravilhosa o poder criador de Deus.
Não, não há nada de oposto à fé cristã numa teoria da evolução científica, baseada em fatos sólidos e desprovida do viés anti-religioso. Quer Deus tenha formado o Universo mediante um ato criador direto, quer mediante um processo evolutivo, continua a ser o seu Criador. Não há inconveniente em supor que os corpos do primeiro homem e da primeira mulher tenham procedido de antropoides evoluídos, se a Deus lhe aprouve faze-lo assim. Continuaria a ser verdade que os nossos corpos foram formados do barro da terra (Gên 2,7)
Portanto, nenhuma das descobertas da Antropologia ou da Paleontologia, pôe em perigo a nossa fé, pela simples razão de que estas ciências não são capazes de explicar o abismo que separa o instinto animal da razão humana. A capacidade de pensar e de querer livremente exige a existência de uma alma espiritual, de uma alma que, pela sua própria natureza, não pode resultar de nenhum processo evolutivo, mas só pode provir diretamente do poder criador de Deus.
O que nós, como cristãos, temos de sustentar é o que a Sagrada Escritura nos ensina com toda a clareza no livro do Gênesis, valendo-se de uma linguagem que em parte é didática e em parte poética. E a substância desse ensinamento é esta: Em primeiro lugar, que Deus é o Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis; um modo pelo qual as criou não vem ao caso. Em segundo lugar, que todo o gênero humano descende de um único casal original, de um homem e uma mulher. Em terceiro lugar, que a alma de cada ser humano - não somente as de Adão e Eva - é criada direta e imediatamente por Deus; pois a alma, sendo de natureza espiritual, não pode porvir da matéria por evolução, e da mesma forma não pode ser transmitida geneticamente pelos pais.
Estes são os pontos em que devemos crer. A pesquisa científica sobre a origem do Universo prossegue e prosseguirá. Neste trabalho, os cientistas católicos são e continuarão a ser tão objeticos e tão ávidos de novas descobertas como quaisquer outros. E levarão avante as suas pesquisas sem o menos temor de que a sua fé possa perigar, porque sabem perfeitamente que a verdade é uma só; toda verdade vem de Deus, e Deus não se contradiz.
Animal...Racional.
Muito bem, mas..afinal de contas, o que é que nos torna diferentes dos animais? Para começar, é preciso reconhecer que nós somos animais.Em filosofia, o homem define-se precisamente como animal racional. É esta última palavra, racional, que exprime aquilo que nos torna diferentes dos outros animais.
Há três tipos de seres vivos: plantas, animais e homens. Classicamente, fala-se por isso de três tipos de "almas", tomando-se esta palavra no sentido de princípio vital. A "alma" vegetativa é o princípio interno à planta que a faz viver, crescer e reproduzir-se; está intimamente ligada à matéria e não possui existência independente; por isso, deixa de existir a partir do momento em que a planta morre.
Nos animais, temos a "alma sensitiva", que é o princípio que lhes permite não somente viver, crescer e reproduzir-se, mas também ver, ouvir e cheirar, sentir dor e experimentar prazer, e deslocar-se de um lugar para outro. Apesar deste princípio vital ser superior ao das plantas, continua a ser inteiramente dependente da matéria, a não ter uma existência autônoma, e por isso também deixa de existir quando o animal morre.
Finalmente, temos alma propriamente dita, a alma espiritual, também chamada as vezes alma racional ou intelectual, que pressupõe e assume as outras duas. Através dela, o homem não se limita a viver, crescer e reproduzir-se, como faz a planta: nem se limita a ver, ouvir, cheirar, sentir dor ou prazer e mover-se, como faz um animal. Graças a ela, o homem atinge um novo nível de existência a que uma alma meramente material não poderia eleva-lo: torna-se capaz de pensar. Graças a ela, somos capazes de selecionar, comparar, escolher e examinar os inúmeros dados particulares que nos chegam através dos sentidos - as imagens que vemos, os sons, os odores, os gostos, as experiências táteis. E, a partir daí, de chegar a conhecimentos novos, elaborar conceitos abstratos e tirar conclusões. Um animal pode ver centenas de árvores, e no entanto é incapaz de concluir que todas elas tem um tronco feito de madeira, e muito menos de escrever um poema como Minha terra tem palmeiras, de Gonçalves Dias. Mesmo que veja mil triângulos, nenhum animal será capaz de descobrir que o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos.
É principalmente graças a esta capacidade de raciocínio que o homem é imagem e semelhança de Deus. Todas as coisas criadas são, de alguma forma, e cada qual num certo grau, uma imagem de Deus: "Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos", canta David no seu salmo 18,1. A rocha sólida e áspera, o floco de neve com a sua delicada simetria, a flor casta e fragrante, o inseto laborioso, o majestoso elefante - e, como coroa de tudo isso, o homem -, todas as coisas que existem fazem parte de um único e grandioso mosaico que nos fala da Grandeza e do Poder, da Beleza e da Bondade de Deus.
Mas quando dizemos que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, queremos exprimir co isso qualquer coisa de muito especial. Porque nós, os homens, não nos limitamos a refletir a Bondade,Beleza e Onipotência divinas, como o fazem toas as outras criaturas do Universo. Graças à nossa alma espiritual, somos como espelhos que refletem de maneira muito mais perfeita esse Espírito infinitamente perfeito que é Deus. Graças ao nosso intelecto, com a sua capacidade de compreender e raciocinar, refletimos a Sabedoria e o Conhecimento de Deus. Graças à nossa vontade livre, ao nosso poder de escolha responsável, somos capazes de refletir a infinita Liberdade de Deus.
Mas não somos espíritos puros,independentes da matéria, como o são os anjos. Não se pode dizer que um homem seja somente a sua alma, como também não podemos dizer que é somente o seu corpo. Somos criaturas compostas, feitas de alma e corpo. Este último não é mero instrumento da alma, como o é uma serra nas mãos de um carpinteiro; é muito mais do que isso. para poder desabrochar na plenitude do seu ser, para ser inteiramente aquilo que deve ser, a alma precisa do corpo, porque foi criada para estar unida a ela e seria incompleta sem ele.
Com perdão da comparação, um tanto rudimentar, estamos diante de algo semelhante ao motor de um automóvel, que está projetado para funcionar em conjunto com o "corpo" desse automóvel. É perfeitamente possível retirar o motor e pô-lo a funcionar sobre uma bancada, isolado do chassi; mas, para realizar aquilo que está feito para realizar, para ser plenamente eficaz, o motor precisa do chassi e está incompleto sem ele. Quando a alma abandona o corpo, no momento da morte, continua a viver e a funcionar sem ele - pelo menos até a ressurreição dos corpos -, como veremos. Mas, nesta vida, alma e corpo são duas partes interdependentes de uma única e singular pessoa humana completa, e a alma só pode agir através do corpo.
Toda a alma humana, tal como sai das mãos criadoras de Deus, é perfeita em si mesma, mas pode ver-se limitada por um corpo imperfeito. Essas imperfeições podem ser o resultado de algum acidente ou doença, ou ser hereditárias - pode tratar-se de lesões cerebrais, de deficiências glandulares ou de uma centena de outras coisas que dificultam a ação da alma. Com isto, pretendo somente indicar que os idiotas, imbecis e psicopatas, no sentido médico, não estão desprovidos de alma simplesmente por estarem desprovidos de parte de suas funções cerebrais. No seu íntimo, continuam a ter uma alma perfeita, que talvez tenha de esperar pela Eternidade para poder exercer plenamente as suas elevadas faculdades intelectuais e volitivas, tornadas incapazes nesta vida pelas deficiências do seu organismo.
Fonte: A Sabedoria do Cristão
Veja:
1 - O Cristão e o descrente
2 - As Razões de nossa Esperança
3 - Deus existe? do nada, nada se cria
4 - Razão, Ordem e Evolução
Depois veremos: Alma imortal?
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