terça-feira, 16 de agosto de 2011

Por que devo ter uma religião?


Por Pe Léo Trese


A Lei Natural


Se construo um relógio, tenho o direito de esperar que me diga que horas são; afinal, foi para isso que o fiz. Se fabrico uma lâmpada, tenho o direito de esperar que me dê luz, porque foi para isso que a fiz. Da mesma forma, Deus tem direito a esperar que o Universo que Ele criou cumpra a finalidade para a qual foi criado. Na verdade, tem o direito de esperar que cada uma das partes do Universo cumpra o fim para qual foi feita.


Com relação a todas as criaturas inferiores ao homem, era uma tarefa fácil para Deus assegurar que fariam o que Ele desejava que fizessem. Para as pedras, as plantas e os animais, estabeleceu o que chamamos “leis físicas”, leis que fazem com que as coisas se comportem sempre de tal maneira que cumpram sua finalidade, isto é, que se comportem de acordo com sua natureza. Assim, uma pedra “agirá”sempre como pedra, uma árvore como árvore, um pássaro como pássaro.


Para os seres inertes, existem leis como a da gravidade, as da ótica, as da termodinâmicas, as que regem a propagação das ondas sonoras, etc, e todas essas outras leis físicas que não admitem possibilidades de escolha; isto é, são leis a que a matéria tem de obedecer sempre. Para os seres vivos, tais como as plantas e os animais, acrescentam-se às leis físicas e químicas outras leis, como as que regem o crescimento e a reprodução; e os animais contam, além das anteriores, com a lei do instinto, que lhes permite fazer o que devem fazer em resposta aos estímulos que lhes vêm de fora, mas ainda sem disporem de opções ou de um verdadeiro raciocínio.


Mas o ser humano tinha de ser governado de maneira diferente.


Deus dotou-nos de livre-arbítrio, e portanto seria contraditório que Ele mesmo destruisse logo a seguir a nossa liberdade, impondo-nos umas leis que não admitissem escolha alguma, leis que nos forçassem a agir sempre de acordo com a sua vontade ou, o que é o mesmo, a agir sempre tal como um ser humano deveria agir. É verdade que o nosso corpo está submetido às leis físicas, tal como qualquer outro corpo material. Quando tropeçamos, a lei da gravidade leva-nos ao chão com a mesma velocidade com que levaria qualquer pedra. A nossa visão e audição tem de ajustar-se às leis da ótica e da acústica. As nossas células nutritivas e reprodutivas obedecem aos mesmos princípios que regem todas as criaturas inferiores.


Mas, quando desempenhamos o nosso papel de seres humanos, isto é, quando pomos em funcionamento as nossas atividades superiores, as atividades que exercemos como criaturas simultaneamente espirituais e materiais, entra em jogo um tipo diferente de lei. Tem de tratar-se de uma lei que respeite a nossa liberdade, ao mesmo tempo que nos obriga de alguma forma. Essa lei exige a nós – como, aliás, Deus em justiça exige de toda criação – que nos comportemos de acordo com a nossa natureza, isto é, tal como uns seres humanos dotados de alma espiritual devem comportar-se. Mas a obrigação que essa lei nos impõe não é uma necessidade física, e sim uma obrigação moral. Estamos, portanto, moralmente obrigados a agir tal como um ser humano deve agir, mas fisicamente livres para nos recusamos a agir assim.


Suponhamos que me veja diante da alternativa de roubar ou não roubar. A razão me diz que é essencial, para minha realização como ser humano, respeitar a propriedade alheia. O homem é um ser social, e está destinado a viver em companhia dos outros, já que, até certo ponto, todos dependemos uns dos outros. Não somos simples indivíduos isolados; somos membros de uma comunidade. Ora, o roubo destrói as próprias bases da convivência, da mútua dependência.


Portanto, o roubo contraria a minha própria natureza, como ser humano, opõe-se à finalidade para a qual Deus me criou. É por isso que a simples razão, mesmo deixando de lado tudo o que a religião ensina, é suficiente para mostrar-me que é errado roubar.


Talvez percebemos agora que a distinção entre o “certo”e o “errado”não depende simplesmente de umas quantas regras que Deus teria estabelecido arbitrariamente. O “certo”e o “errado”são realidades profundamente arraigadas na minha natureza de ser humano. Tal ou qual ato será bom, estará “certo”, na medida em que estiver de acordo com o fim para o qual Deus me criou, tal como um relógio “está certo”na medida em que informa corretamente a hora, e a lâmpada é “boa”na medida em que dá luz.


Talvez percebemos também que o perfeito uso da liberdade não consiste em escolher entre o que é bom e o que é mau, mas antes em escolher entre este ou aquele bem. Somos fisicamente livres de escolher o mal, mas, ao fazê-lo, não usamos propriamente da liberdade que Deus nos deu; antes, abusamos dela.


A responsabilidade que, em consequência, temos diante de Deus – uma responsabilidade que, comos vimos, deriva da própria natureza humana – é chamada Lei Natural. Qualquer homem em seu são juízo, se não estiver cegado pela paixão ou pelos preconceitos, sabe perfeitamente que determinadas atitudes são corretas e outras erradas. A sua razão, mesmo sem a ajuda de qualquer religião, diz-lhe que a propriedade alheia deve ser respeitada, os pais devem ser honrados, o cônjuge de outra pessoa deve ser respeitado, e Deus deve ser adorado. É isto o que queremos dizer quando falamos de Lei Natural.


Dar a Deus o que é de Deus


Só quero justiça!”: este é, invariavelmente, o comentário feito por que quer que apresente uma petição judicial ou uma queixa à polícia. Essa pessoa quer que sejam respeitados os seus direitos. Quer aquilo que lhe é devido!


Pois bem, também Deus quer que sejam respeitados os seus direitos, quer que lhe seja feita justiça. Foi Ele quem fez o Universo (incluindo-se nele o gênero humano) para que manifestasse a sua glória. É verdade que, como diz o Catecismo, “Deus nos fez para que sejamos felizes para sempre com Ele no céu”. Esta formulação, no entento, só nos apresenta essa verdade do nosso ponto de vista. Encontraremos, sem dúvida, a felicidade, mas a felicidade é um resultado, algo que deriva do cumprimento dos nossos deveres para com Deus. Se realizarmos a finalidade para a qual Ele nos fez, se decidirmos livremente desempenhar o papel que nos cabe dentro do concerto universal que canta a glória de Deus, a felicidade será um subproduto.


As estrelas e os planetas, o vento e as águas, as flores, os animais e as aves, todos esses seres manifestam necessariamente a glória de Deus, sem que lhes seja dada a possiblidade de escolher entre faze-lo ou não. Somente o ser humano é capaz de oferecer a Deus o maior de todos os louvores, o louvor que lhes damos por livre decisão da nossa parte , sem qualquer tipo de compulsão física.


Mesmo que Deus não nos tivesse enviado nenhuma mensagem especial, a nossa razão seria suficiente para repararmos que temos obrigação de dar a cada um o que lhe é devido. Em outras palavras, a própria Lei Natural nos ordena que pratiquemos a virtude que se encontra na raiz da religião.


É próprio da natureza humana reconhecer a excelência, amar tudo que é bom, obedecer à autoridade legítima, agradecer os favores recebidos. Da mesma forma, temos para com Deus uma dívida: devemos honrar Àquele que é infinitamente perfeito, amar Àquele que é infinitamente bom, obedecer Àquele que nos fez e a quem pertencemos, agradecer Àquele de quem vêm todos os bens. Ou, para dizê-lo com outras palavras, devemos adorar a Deus, devemos praticar a religião.


Mesmo que Deus em pessoa não tivesse vindo à terra, assumindo a natureza humana na pessoa de Jesus Cristo, a fim de nos instruir a respeito de si mesmo; mesmo que nunca tivesse enviado profetas a este mundo, ou inspirado as Sagradas Escrituras; mesmo que tivesse permanecido no mais completo silêncio acerca de Si próprio – mesmo assim, teríamos obrigação de adora-Lo, de praticar a religião.


O fato de a religião – o cumprimento os nossos deveres para com Deus – fazer parte da Lei Natural, de ser uma obrigação reconhecida pela simples razão humana, mesmo que não tivesse havido nenhuma Revelação divina é plenamente corrobado pelas pesquisas de antropologia. Essa ciência que se dedica a estudar os costumes e o comportamento humanos, mostrou e continua mostrar que todos os povos e todas as raças, em todas as épocas da história, praticaram alguma forma de religião.


A única exceção que se pôde descobrir foram umas poucas tribos selvagens isoladas que haviam degenarado a ponto de se tornarem quase desumanas, desprovidas até das mais rudimentares evidências da dignidade humana. Isto, diga-se de passagem, é a melhor resposta que podemos dar a esses pagãos modernos, segundo os quais a religião não passa de algo inventado pelo próprio homem em algum ponto da escala da evolução, uma forma de auto-ilusão pela qual o homem primitivo procurava explicar os fenômenos naturais que não compreendia e sentir segurança diante dos poderes desconhecidos e ameaçados que não podia dominar.


Como é evidente, mesmo os povos antigos , mais civilizados, como gregos ou os romanos, cometeram erros gritantes no que diz respeito à prática da religião. Se tivermos em conta a doutrina de pecado original, que obscureceu e enfraqueceu a inteligência humana, era de esperar que fosse assim. Por isso, é natural que esses povos tenham multiplicado os seus deuses, identificando-os às vezes com as forças da natureza, como o sol, a lua, a chuva ou o raio. No entanto, mesmo as formas mais idolátricas de religião preservaram uma crença mais ou menos vaga numa divindade superior ou suprema. É um poderoso testemunho em favor da força da Lei Natural o fato de ela ter sido capaz de impor-se mesmo através das névoas de um intelecto ferido pelo pecado.


Até agora, falamos unicamente daquilo que se constuma chamar “Religião natural”- isto é, da religião tal como o homem é capaz de conhece-la guiado unicamente pela luz da razão. Mas, com a queda de Adão, tornou quase impossível que os homens – a não ser algumas mentes excepcionais, como as de Platão e Aristóteles – descobrissem por si mesmos a verdade, Deus teve de entrar novamente em cena. Para evitar que nos afundássemos mais e mais no erro, decidiu ajudar-nos a conhecer, por Revelação, não somente aquelas verdades que, deveríamos ter descoberto naturalmente – por exemplo, a sua eternidade e a sua infinita perfeição -, como também muitas outras que nunca teríamos podido descobrir apenas por meio das nossas próprias forças – por exemplo, a existência de três Pessoas em Deus, ou o fato de estarmos destinados à união eterna com Deus. Estas e todas as outras verdades reveladas diretamente por Deus constituem aquilo que se costuma chamar”religião Sobrenatural”


Fonte: A sabedoria do Cristão


1 - O Cristão e o descrente

2 - As Razões de nossa Esperança

3 - Deus existe? do nada, nada se cria

4 - Razão, Ordem e Evolução

5 - Que é o homem? Criação ou Evolução?

6 - Imortal e Livre


Depois veremos: Como começou a Religião? – Fatos e Mitos

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