segunda-feira, 11 de julho de 2011

A Vida da Graça - das virtudes e dos dons

A Vida Espiritual - Explicada e Comentada - de Adolfh Tanquerey

Existência e natureza

A vida sobrenatural, inserida em nossa alma pela graça habitual, exige, para operar e se desenvolver, faculdades de ordem sobrenatural que a liberdade divina nos outorga generosamente com o nome de virtudes infusas e dons do Espírito Santo: « O homem justo, diz Leão XIII, que vive da graça e opera por meio das virtudes que nele desempenham as faculdades, necessita igualmente dos sete dons do Espírito Santo: Homini iusto, vitam scilicet vivent divinae gratiae et per côngruas virtutes tanquan facultates agenti, opus plane est septenis, illis, quae proprie di_D.Spiritus Sancti donis»

Convém, na verdade, que as nossas faculdades naturais, que por si mesmas não podem produzir senão atos da mesma ordem, sejam aperfeiçoadas e divinizadas por hábitos infusos que as elevem e auxiliem a operar sobrenaturalmente. E, como a liberalidade de Deus é grande, dá-nos duas espécies de hábitos: as virtudes que, sob a direção da prudência, nos permitem operar sobrenaturalmente com o concurso da graça atual, e os dons, que nos tornam tão dóceis à ação do Espírito que, guiados por uma espécie de instinto divino, somos, por dizer, movidos e dirigidos por este divino Espírito.

A diferença essencial entre as virtudes e os dons vem, pois, pela maneira diferente de operar em nós: no exercício das virtudes, a graça deixa-nos ativos, sob o influxo da prudência; no uso dos dons, quanto estes atingiram pleno desenvolvimento, exige de nós mais maleabilidade do que atividade.

Entretanto uma comparação nos ajudará a compreender isto: quando a mãe ensina o filho a andar, umas vezes contenta-se de lhe guiar os passos, impedindo-o de cair, outras toma-o nos braços, para o ajudar a vencer um obstáculo ou lhe dar um pouco de descanso; no primeiro caso é a graça cooperante das virtudes; no segundo, é a graça operante dos dons.

Mas daqui resulta que, normalmente, os atos feitos sob o influxo dos dons são mais perfeitos que os praticados somente sob a influência das virtudes, precisamente porque a ação do Espírito Santo no primeiro caso é mais ativa e fecunda.É mister advertir, porém, que estes dons, que nos são conferidos com as virtudes e a graça habitual ,não se exercem de modo freqüente e intenso senão nas almas mortificadas, que, por longa prática das virtudes morais e teologais, adquirem essa maleabilidade sobrenatural que as toma completamente dóceis às inspirações do Espírito Santo.

Das Virtudes Infusas

É certo, conforme o Concílio de Trento, que no próprio momento da justificação recebemos as virtudes infusas da fé, esperança e caridade - teologais.E é doutrina comum, confirmada pelo Catecismo do Concílio de Trento, que as virtudes morais de prudência, justiça, fortaleza e temperança nos são comunicadas no mesmo instante.Não esqueçamos que estas virtudes nos dão, não a facilidade, senão o poder sobrenatural próximo de praticar atos sobrenaturais; serão necessários atos repetidos, para a esse poder acrescentar a facilidade que dá o hábito adquirido.

Vejamos como estas virtudes nos sobrenaturalizam as faculdades.

a) Umas são teologais, porque têm a Deus por objeto material, e algum atributo divino por objeto formal.
- A fé une-nos a Deus, suprema verdade, e ajuda-nos a ver e apreciar tudo à sua luz divina.
- A esperança une-nos Àquele que é a fonte da nossa felicidade, sempre disposto a derramar sobre nós os seus benefícios, para consumar a nossa transformação, e ajudar-nos com o seu poderoso auxílio a fazer atos de confiança absoluta e de filial entrega nas mãos de Deus sumamente bom em si mesmo; sob a sua influência, comprazemo-nos nas perfeições infinitas de Deus mais que fossem nossas, desejamos que sejam conhecidas e glorificadas, travamos com Ele uma santa amizade, uma doce familiaridade, e assim nos tomamos mais e mais semelhantes ao Altíssimo.

Estas três virtudes teologais unem-nos, pois, diretamente a Deus.

a) As virtudes morais, que têm por objeto um bem honesto distinto de Deus, e por motivo a própria honestidade desse objeto, favorecem e perpetuam essa união com Deus, regulando tão bem as nossas ações que, a despeito dos obstáculos que se encontram dentro e fora de nós, tendem sem cessar para Deus.

Assim é que a prudência nos leva a escolher os melhores meios para o nosso fim sobrenatural. A justiça, fazendo-nos dar ao próximo o que lhe é devido, santifica as nossas relações com nossoS irmãos de tal forma que nos aproxima de Deus. A fortaleza arma-nos a alma contra a provação e a luta, faz-nos levar com paciência os sofrimentos e empreender com santo arrojo os mais árduos trabalhos, para promover a gló' ria de Deus.E, como o prazer criminoso nos afastaria disse, a temperança modera em nós a ânsia do prazer, e subordina-o à lei do dever.

E assim todas estas virtudes desempenham importantíssimo papel em remover o obstáculo, e fornecer-nos até meios positivos que nos levem a Deus

Dos dons do Espírito Santo

Os dons, sem serem mais perfeitos que as virtudes teologais e sobretudo que a caridade, aperfeiçoam o exercício de todas elas.

Assim, o dom de entendimento faz-nos penetrar mais intimamente as verdades fé, para descobrirmos os seus tesouros escondidos, e harmonias misteriosas; o de ciência faz-nos considerar as coisas criadas nas suas relação com Deus. O dom do temor fortifica a esperança, desapegando-nos falsos bens da terra, que nos poderiam arrastar ao pecado, e por isso o aumenta em nós os desejos dos bens do céu. O dom de sapiência fazendo-nos gostar as coisas divinas, aumenta o nosso amor para com Deus. A prudência é sobremaneira aperfeiçoada pelo dom de conselho, que nos permite conhecer, nos casos particulares e dificultosos, o que é conveniente fazer ou omitir. O dom de piedade aperfeiçoa a virtude de religião, que se relaciona com a justiça, fazendo-nos ver em Deus pai que somos venturosos de glorificar por amor. O dom de fortalezacompleta a virtude do mesmo nome, excitando-nos a praticar o que de mais heróico na paciência e na ação. Enfim o dom de temor, além facilitar a esperança, aperfeiçoa em nós a temperança, fazendo temer castigos e os males que resultam do amor ilegítimo dos prazeres.

É assim que se desenvolvem harmonicamente em nossa alma as virtudes e os dons, sob a influência da graça atual.

Próximo assunto: a graça atual

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